As janelas
da biblioteca estão abertas de par em par. Os raios de sol iluminam as
prateleiras viradas a nascente; o resto permanece ainda na penumbra do
amanhecer.
Magnifica colecção de livros que a família adquiriu ao longo
dos últimos duzentos anos. Homens notáveis tinham ido ali procurar edições raras
e beneficiar da paz e silêncio para reflectir, ler e escrever. Era uma
atmosfera quase religiosa, um lugar onde o
passado se entranhava no presente e se projectava no futuro. A calma era total,
só a brisa leve da Primavera agitava as folhas dos plátanos e o cheiro da
madressilva perfumava o ar.
Martim é o
neto mais novo e também o mais intelectual; a biblioteca é o seu
mundo, passa horas folheando livros, tomando notas. Tinha agora a
responsabilidade da reorganização de toda a literatura do século XIX e XX. Quer
tornar aquele espaço público, deixar que outros possam encontrar ali a resposta
a dúvidas e a inspiração para novos projectos. Naquela manhã sente-se renovado,
a Primavera deixa-o estimulado, possuído por uma nova energia.
Entra decidido a encontrar um livro raro de poesia, escrito
por um famoso poeta da época e ilustrado pela sua avó. Não a conhecera, mas
sabia que era dotada de uma rara sensibilidade e uma enorme independência de
espírito. O avô nunca falava dela, Marim achava estranho mas não fazia
perguntas.
Os livros de poesia estão nas prateleiras de cima e de
difícil acesso; empurra o pequeno escadote e começa a procurar. Sim, é aquele
mesmo, na capa o desenho de um pássaro. Abre-o curioso e ansioso como se
estivesse a entrar na intimidade de alguém, folheia-o, duas rosas secas estão
coladas às primeiras páginas. Começa a ler e não quer acreditar; são poemas de
amor intenso, liberto, quase libertino, dedicados a Vitória…sua avó.
Desafio subtil, dimâmico, suave, ritmado, inspirador ( os livros... os livros que tanta falta nos fazem e muitas vezes ficam esquecidos algures á espera de serem abertos) espectante e no final apetece abraçar o Marim:)
ResponderEliminar